segunda-feira, janeiro 02, 2012

O dia em que decidi nunca mais comprar um Swatch


Ilustríssimos amigos, colegas e companheiros da estrada da vida, ao fim de alguns anos, e já com 2 bebés no colo (como o tempo passa) voltei a um dos meus exercícios de libertação favoritos: escrever umas linhas.
Desta vez lembrei-me de escrever sobre um tema engraçado: o "dia em que decidi nunca mais comprar um Swatch". Na verdade esse era um dia igual a tantos outros, não fora o fato de estar farto até aos olhos de procurar uma bracelete para um relógio Swatch, que as lojas Swatch teimavam em não ter...mas não fiquem a pensar que era A bracelete....não não, era mesa UMA (e qualquer) bracelete que se pudesse acoplar ao relógio. À beira de literalmente matar o tempo na figura do meu relógio, lembro-me da minha primeira experiência com a Swatch: foi há uns 15 anos: comprei um modelo bem simples, de plástico, inspirado nos Jogos Olímpicos que a vendedora, uma brasileira que vivia nos Estados Unidos, pronunciou "Discó-Bólo", quando na verdade quereria dizer "Discóbolo". A partir daí aderi à acessibilidade de poder ter vários relógios Swatch, de várias cores, modelos, materiais, motivos, etc....foi uma das principais histórias, depois dos "Nike Air e dos Reebok Pump" que eu comprei e trouxe para dentro do meu dia a dia....Quem me quisesse oferecer um relógio podia ser Swatch....e preferira muito mais estes relógios que qualquer outro, de qualquer outra marca que estivesse nas mais caras wishing-lists.
Várias vezes, em aulas de negócios, a Swatch era um dos cases mais famosos de como reinventar um novo produto, de como agregar um valor impressionante a algo que fora sempre igual, duradouro (o relógio passava de família para família), de como a massificação do relógio e novos materiais de construção atraiam para este mercado margens e volumes de vendas cabalísticos....o Swatch era a minha cara: dava-me o poder de escolher qual seria a minha forma de ver o tempo, de o controlar e de o seguir: que magnetismo poderoso tinha a Swatch na minha vida! (mesmo para quem nunca foi fanático de relógios). Foi engraçado ser um seguidor fiel desta marca ao ponto de em mais de uma década não ter qualquer outra marca de relógio.
Uma das coisas que me fascinava era a de poder escolher a bracelete diferente, a facilidade com que podíamos entrar numa loja, escolher e comprar um produto Swatch...tudo era fácil, o relógio era acertado para o nosso pulso na hora, etc, etc. Acho que agora, passado o enamoramento, me dou conta de como era uma verdadeira experiência ter um Swatch, onde a customização começava a dialogar com um produto que costumava ser para toda a vida, e em regra passava de geração em geração.
No meio desse fascínio e de uma história tão corentemente contada, surge um imprevisto: precisei de ter que trocar a bracelete porque a antiga se havia partido. Imaginei novamente como seria fácil entrar numa loja Swatch e escolher entre centenas de braceletes, de como seriam atenciosos em colocá-la e sairia totalmente satisfeito dessa loja. O engraçado é que entrei em largas dezenas de lojas Swatch (mais de 10!) e nenhum tinha nenhuma bracelete que me pudesse vender, porque estava a chegar a coleção nova...Como imaginam, quem visita mais de 10 lojas já só quer uma simple se funcional bracelete para poder tirar o relógio do bolso e poder colocá-lo no pulso. Ao final de longas semanas de procurar descobri que ainda não estava pronto para autorgar à Swatch o direito de decidir quando o meu relógio se tornaria obsoleto ou descartável e assim, de uma forma quase instantânea decidi que nunca mais compraria um relógio Swatch, tanto para mim como para oferecer. Hoje, e apesar de muitos dos meus colegas ainda usarem Swatch, e de eu mesmo conservar alguns deles bem velhinhos, olho para a Swatch com a sensação de namoro de verão: ficou no passado sem qualquer necessidade de se repetir no presente.
Dentro de uma moldura de Marketing imagino que houvesse diversas interpretações a extrair deste episódio, ainda que na minha opinião, e expectativa de encurtar a vida de um produto pode resultar num jogo de poker complicado, onde um bluff não parece ser uma hipótese a ter em conta. Ao mudarmos a vida útil de um produto, ao condená-lo antes do tempo que o mercado imagina, podemos tornar a nossa proposta de valor, ou como eu prefiro chamar, a "História" dele vazia, inconsistente e incoerente, fazendo crer que essa história poderá ser tão somente uma frenética mentira repetida vezes sem conta.